18 abr 2017 – IR / Contribuições
O governo e a indústria de veículos começaram a negociar a política setorial que vai substituir, a partir de janeiro do ano que vem, o regime de incentivo à indústria automobilística nacional que foi condenado pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Desde o mês passado, as partes trabalham em cima de um cronograma que fixa uma data de publicação do novo programa: 30 de agosto.
Ainda tratados em linhas gerais, os temas em discussão vão da recuperação da indústria de autopeças ao custo de produção e tributação dos veículos montados no País, passando pela possibilidade de um programa nacional de inspeção veicular para, indiretamente, estimular a renovação de frotas.
Também serão discutidas novas metas de eficiência energética – cobradas pelo governo aos automóveis fabricados no Brasil -, bem como exigências de segurança veicular e incentivos a investimentos em inovação e desenvolvimento de sistemas eletrônicos.
Esses temas foram distribuídos a seis grupos de trabalho, que irão debater o que está sendo chamado pelos negociadores de novo ciclo da política industrial automotiva. Cada grupo é composto por executivos das entidades que representam as montadoras (Anfavea) e os fornecedores de peças (Sindipeças), além da Abeifa, que abriga importadores de carros, e da Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA), instituição que reúne engenheiros de automóveis e que atuará como mediadora técnica das discussões.
Nas reuniões, serão apresentadas as propostas dos setores privados ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic). Até a primeira quinzena de junho, haverá reuniões semanais entre as entidades e o governo. Depois disso, partindo de um conjunto de medidas negociadas com a indústria, o Mdic de três meses para editar a política automotiva em conjunto com outras quatro pastas: Fazenda, Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente, e Minas e Energia.
O Bndes também está envolvido no processo. Se tudo sair dentro do previsto, o plano será anunciado em 30 de agosto. A fixação da data não foi feita fortuitamente. A ideia é que o governo tenha margem de tempo para promover ajustes e regulamentar o programa antes do término do regime automotivo em vigor. Batizado de Inovar-Auto, o regime automotivo atual foi lançado em outubro de 2012, e suas regras são válidas até 31 de dezembro deste ano. A política foi condenada pela OMC em novembro, mas a estratégia do governo é recorrer para arrastar o processo até o fim do ano, preservando assim a vigência do programa.
Ao fechar portas a importações de automóveis, que passaram a ser sobretaxados em 30 pontos percentuais na cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Inovar-Auto estimulou investimentos em novas fábricas de carros no País, induzindo, inclusive, a chegada de marcas de carros de luxo, como Mercedes-Benz, Audi e BMW.
Agora, com as vendas de veículos no patamar mais baixo em uma década, o propósito da política industrial em negociação é dar competitividade aos automóveis brasileiros em mercados internacionais, algo não resolvido pelo regime atual. “Nossa indústria tem de ser capaz, no futuro, de competir internacionalmente em boas condições”, afirma o presidente da Anfavea, Antonio Megale, que, em benefício da previsibilidade, cobra a vigência de pelo menos 10 anos no novo programa – o dobro do período do Inovar-Auto.
Como o governo tem buscado assinar acordos de livre comércio com outros países, inclusive com a União Europeia, o executivo tem a preocupação de que o Brasil, sem força para competir no mercado internacional, acabe inundado por veículos importados. Para o presidente da Anfavea, o melhor caminho para elevar a competitividade das montadoras é atacar aspectos estruturais, como legislação trabalhista, tributação e logística. Com o equacionamento dessas questões e um ambiente mais simples e desburocratizado, o Brasil se consolidaria, na sua visão, como um polo de exportação de veículos.
As medidas específicas para a nova etapa do Inovar-Auto ainda não foram colocadas na mesa. Fontes próximas ao programa que está sendo construído em Brasília dizem que as discussões partem praticamente do zero. O Sindipeças comentou que, como os trabalhos estão apenas começando, é prematuro dar detalhes sobre o tema.
Uma parcela da indústria considera que a demora no início das negociações pode inviabilizar os prazos almejados. O governo só chamou os setores para iniciar a conversa há poucas semanas, formando os grupos de trabalho apenas na semana passada. Também existe a percepção de que são muitos temas para pouco tempo. “Preocupa tentar tudo e não conseguir nada”, disse o executivo de uma grande montadora.
Embora ainda haja incertezas em relação ao desenho do programa, um ponto é consenso: não haverá mais sobretaxação de 30 pontos percentuais a importados. Com a condenação na OMC, tornou-se inviável renovar o Inovar-Auto da forma como está. Ainda assim, a Abeifa diz que sua posição será de lutar contra manobras que mantenham a proteção a montadoras nacionais. “A única coisa que a Abeifa não concorda é a continuidade dos 30 pontos. Será impossível manter a rede de concessionárias viva”, afirma José Luiz Gandini, presidente da associação.
Fonte: Jornal do Comércio RS