3 mai 2017 – Contabilidade / Societário
É com grande preocupação que percebo que a maior parte dos profissionais contábeis não conhecem os impactos que a IFRS 15 (CPC 47) trará para as empresas e seus controles internos.
Esta norma é fruto de doze anos de debate a nível internacional. O IASB recebeu o recorde de contribuições (1.337), por meio das cartas comentários, enviadas de todos os continentes e setores econômicos. A norma foi aprovada no Brasil em 2016 e entrará em vigor em 1° de janeiro de 2018. Esta norma revoga TODAS as normas de reconhecimento de receita, incluindo algumas interpretações e orientações específicas.
O que muda?
A partir de agora, a receita será reconhecida com a satisfação da obrigação de desempenho. Mas, o que é uma obrigação de desempenho (OD)? Este é um conceito que até então não estávamos familiarizado. OD é a obrigação da empresa vendedora em transferir bens ou serviços aos seus clientes. E qual é o propósito deste novo conceito? A ideia central é que as empresas devem segregar suas OD’s, caso estas sejam distintas, reconhecendo receita por cada tipo de obrigação. Imagine uma empresa que venda em um mesmo contrato um equipamento, incluindo sua instalação. Neste caso, como o cliente pode solicitar a instalação de outro fornecedor, não se configurando como serviço inter-relacionado, é necessário que o preço do contrato seja segregado para a entrega do equipamento e para o serviço de instalação. Logo, a receita será reconhecida em dois diferentes momentos: quando da transferência do equipamento e quando da prestação de serviço de instalação. Agora imagine fazer esta análise contrato a contrato, analisando se as OD’s serão transferidas em um mesmo momento ou em diferentes momentos no tempo.
Quais os setores que poderão ser mais afetados?
Setor de construção, software, terceirização, indústria e serviço geral. Ou seja, quase todos!
Teremos mudanças tributárias?
Sim, pois, havendo mudança no momento de reconhecimento das receitas, haverá impactos tributários, podendo existir descasamento entre tributação e receitas.
O que mais muda?
É possível estimar no preço de transação um valor variável, desde que não seja provável uma reversão significativa deste valor, após a incerteza ser resolvida. Além disto, como a receita precisa ser reconhecida por cada OD, é necessário alocar o preço de transação contratual a cada uma das OD’s. Estes métodos de alocação são subjetivos e irão influenciar diretamente a mensuração da receita. Desafio será encontrado na alocação do preço de transação quando da concessão de descontos, sendo necessária uma integração com o setor comercial da entidade. Algumas empresas que reconhecem receita ao longo do tempo (pelo método da porcentagem completada) poderá reconhecer receita em um ponto no tempo ou mesmo que encontre base conceitual para o critério anterior, poderá alterar suas bases de mensuração. As garantias de produtos precisarão ser analisadas individualmente, para se identificar se é uma OD separada ou não. Os contratos ao serem modificados (no escopo, no preço ou em ambos) precisarão ser individualmente analisados, com o objetivo de verificar se há necessidade de ajuste retrospectivo nas receitas.
Conclusão:
A receita é uma das principais métricas de avaliação de desempenho e uma das mais utilizadas para fraudes e manipulações contábeis. É preciso se aprofundar nos critérios da IFRS 15, pelos seus impactos tributários, financeiros (pagamento de bônus, dividendos) e societários (evitando republicação de balanços). Esta norma prova que não é possível reconhecer receitas apenas pela análise das notas fiscais. O entendimento da organização e de suas transações será vital para o adequado reconhecimento das receitas.
Por Márcia Ferreira
Fonte: Jornal contábil