29 jun 2018 – Trabalho / Previdência
O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta quinta-feira (28), o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5794, na qual se questiona o fim da compulsoriedade da contribuição sindical. Após os votos dos ministros Edson Fachin, relator, e Luiz Fux, o julgamento foi suspenso e prosseguirá na sessão de sexta-feira (29), marcada para as 9h.
A ADI 5794 foi ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos (CONTTMAF). O objeto de contestação é o artigo 1º da Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que deu nova redação aos artigos 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para condicionar o recolhimento da contribuição sindical à expressa autorização dos trabalhadores. O julgamento se estende às demais ADIs que pedem o reconhecimento da inconstitucionalidade do dispositivo e, ainda, à Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 55, em que a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert) defende a validade da alteração legislativa.
Pilares
No seu voto pela procedência das ADIs e pela improcedência da ADC, o ministro Edson Fachin traçou o percurso histórico do modelo sindical brasileiro até o regime estabelecido pela Constituição da República de 1988. Segundo o relator, o texto de 1988 trouxe inovações que mitigaram o modelo corporativo altamente controlado pelo Estado vigente desde o Estado Novo. Entre as principais mudanças estão o direito à livre fundação de sindicatos, a liberdade de filiação e de desfiliação, a obrigatoriedade da participação sindical nas negociações coletivas e a possibilidade de instituição, via assembleia, de contribuição confederativa. “A escolha democrática em 1988 do legislador constitucional vincula ao juiz e ao próprio legislador infraconstitucional”, afirmou.
O regime atual, segundo Fachin, baseia-se em três pilares: a unicidade sindical, a representatividade obrigatória e o custeio das entidades sindicais por meio de um tributo, a contribuição sindical. “A mudança de um desses pilares pode ser desestabilizadora de todo o regime sindical”, assinalou.
Para o relator, ao tocar apenas em desses pontos, a Reforma Trabalhista impede os sindicatos de buscar formas de organização mais eficazes para defender os direitos dos trabalhadores perante os interesses patronais. “Ao manter-se, na sistemática constitucional vigente, a unicidade sindical e a obrigação de representação de toda a categoria, incluindo associados e não-associados, a inexistência de uma fonte de custeio obrigatória inviabiliza a atuação do próprio regime sindical”, assinalou.
Tributo
Do ponto de vista formal, o ministro Fachin também entendeu que a mudança legislativa é inconstitucional. A seu ver, a contribuição sindical tem natureza tributária, tanto do ponto de vista da Constituição quanto do da doutrina e da jurisprudência do STF. Sob essa ótica, a alteração de sua natureza jurídica de típico tributo para contribuição facultativa importa inequívoca renúncia fiscal pela União.
O relator observou que a contribuição sindical obrigatória tem destinação específica estabelecida por lei (artigo 589 da CLT), e 10% do valor arrecadado se destinam à Conta Especial Emprego e Salário (FAT), constituindo, portanto, receita pública. Assim, para sua alteração, era obrigação constitucional expressamente prevista no artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) indicar estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro, o que não foi demonstrado nos autos.
Na conclusão de seu voto, o ministro julgou procedente o pedido de declaração da inconstitucionalidade das expressões que fazem referência à autorização prévia dos trabalhadores constantes dos artigos 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da CLT, com a redação dada pelo artigo 1º da Lei 13.467/2017.
Divergência
Adiantando seu voto, o ministro Luiz Fux divergiu do relator e votou pela improcedência das ADIs e pela procedência da ADC. Para ele, a Lei 13.467/2017 não contempla normas gerais de direito tributário e, portanto, a matéria tratada não reclama lei complementar.
Fux também entendeu que a contribuição não é matéria constitucional. “Não há na Constituição qualquer comando que determine a compulsoriedade”, afirmou. O artigo 8º, inciso IV, segundo assinalou, trata da contribuição para custeio do sistema confederativo e remete à lei a contribuição obrigatória.
Ao tratar da intenção do legislador ao tornar a contribuição facultativa, o ministro apontou a proliferação dos sindicatos como uma das consequências do recolhimento obrigatório da parcela: até março de 2017, eram mais de 11 mil sindicatos de trabalhadores e mais de cinco mil de empregadores. Por sua vez, em 2016, a arrecadação da contribuição sindical chegou a R$ 3,9 bilhões. “O legislador constatou que a contribuição compulsória vinha gerando uma oferta excessiva e artificial de organizações sindicais, o que configura uma perda social em detrimento dos trabalhadores”, afirmou. “Esse número estratosférico de sindicatos não se traduzia em aumento de bem-estar de qualquer categoria”.
Para Luiz Fux, a facultatividade se relaciona, ainda, aos direitos fundamentais da liberdade de associação, de sindicalização e de expressão. Na sua avaliação, não se pode admitir que a contribuição sindical seja imposta a trabalhadores e empregadores quando a Constituição determina que ninguém é obrigado a se filiar ou a se manter filiado a uma entidade sindical.
Sob o enfoque da liberdade de expressão, o ministro destacou que é sabido que os sindicatos frequentemente se engajam em atividades políticas, lançando e apoiando candidatos, convocando protestos e mantendo laços com partidos. “O discurso político é o núcleo, por excelência, da liberdade de expressão”, ressaltou. “Ao exigir que indivíduos financiem atividades políticas com as quais não concordam, o regime anterior certamente vulnerava essa garantia fundamental”.
Outro ponto assinalado em seu voto foi o de que os sindicatos ainda dispõem de múltiplas formas de custeio, como as contribuições confederativa e assistencial e outras instituídas pela assembleia da categoria ou por meio de negociação coletiva. “Mais ainda, a Lei 13.247/2017 ampliou as formas de financiamento da assistência jurídica prestada pelos sindicatos, passando a prever o direito dos advogados sindicais à percepção de honorários sucumbenciais”, afirmou, lembrando que, na falta do sindicato, cumpre à Defensoria Pública prestar assistência judiciária no âmbito trabalhista. “O trabalhador não ficará à deriva”, concluiu.
Fonte: STF